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Você está visualizando atualmente A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO “PRINCÍPIO DA CONFIANÇA NO JUIZ DA CAUSA”

Eu tenho visto muitas decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, que, para denegar ordem de habeas corpus, invoca o chamado “princípio da confiança no juiz da causa”.

Eu fiquei pensando – aliás, há tempos penso – se esse “princípio” existe e se é constitucional.

Já pesquisei muito sobre o assunto. Já li alguns livros de processo penal e de direito constitucional, e confesso que não encontrei base filosófica ou científica para esse “princípio”.

Tenho comigo – mas posso estar errado – que esse “princípio” não existe e, se existe, é de duvidosa constitucionalidade. Explico.

A Constituição Federal contempla em seu art. 93, IX, o princípio da fundamentação (ou motivação) das decisões judiciais, segundo o qual todas as decisões do Poder Judiciário devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade.

O saudoso Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, do Superior Tribunal de Justiça, ensinou que “fundamentar é indicar o fato que atrai, no caso, a norma restritiva do exercício do direito de liberdade” (STJ – HC 9135/GO – 6ª T – Rel. Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO – DJ 16.08.1999, grifo nosso).

A doutrina e a jurisprudência são uníssonas em afirmar que a fundamentação constitui requisito de validade e eficácia da decisão judicial

Não só isso. A fundamentação, ensina a doutrina, permite às partes e à sociedade conhecerem as razões do convencimento do juiz, ou seja, o que o levou a decidir como decidiu. Daí ser ela conditio sine qua non para a legitimidade, legalidade e constitucionalidade das decisões judiciais.

Por que estou tecendo comentários sobre o princípio da fundamentação as decisões judiciais e não sobre o “princípio da confiança no juiz da causa”? Por várias razões, a saber: a) uma, porque, no plexo de normas e no contexto normativo da Constituição Federal, não existe base jurídica para afirmar a existência do “princípio da confiança no juiz da causa” – mas posso estar equivocado; b) a duas, porque a confiança não deve ser na pessoa do juiz, e sim nos fundamentos que ele lançou na decisão que proferiu; e, a três, porque esse “princípio da confiança no juiz da causa” permite o subjetivismo judicial – ou “decisionismo processual” (LUIGI FERRAJOLI) -, dificultando o necessário e legítimo controle político, social e jurídico da decisão judicial.

Interessante é que, não raro, esse “princípio” é invocado quando a decisão impugnada no habeas corpus carece de fundamentação idônea. Nessa hipótese, a denegação da ordem só é justificada pela incidência desse “princípio”, fazendo letra morta o mencionado princípio constitucional da fundamentação das decisões judiciais.

Certa vez, eu estava no Superior Tribunal de Justiça assistindo a uma sessão da 6ª Turma, quando o Ministro NILSON NAVES, ao julgar determinado habeas corpus, explicou que o que importava para análise da ilegalidade da prisão é a fundamentação lançada pelo juiz de primeiro grau que a proferiu. E ponderou que pouco importavam as informações do juiz e o acórdão do Tribunal. Em outras palavras, não existe confiança no juiz da causa, e sim nos fundamentos da decisão por ele proferida.

A meu sentir – mas posso estar errado -, o Ministro NAVES simplesmente repeliu, pelo menos em matéria de habeas corpus, esse “princípio da confiança no juiz da causa”.

Sinceramente, espero que esse “princípio da confiança no juiz da causa” deixe de ser empregado para negar ao jurisdicionado o reconhecimento de direitos e garantias fundamentais caríssimos ao Estado Democrático de Direito. 

Espero, ainda, que nossos juízes reconheçam que esse “princípio” não é princípio, mas um mero argumento que não encontra guarida na nossa Constituição Federal. Ou seja, é um argumento (e não “princípio”) inconstitucional.

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