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Você está visualizando atualmente O PRESO E SEU DIREITO DE NÃO RASPAR A CABEÇA

Tenho observado que presos do sexo masculino que ingressam no sistema penitenciário paraense são obrigados a permitir que raspem suas cabeças.

Dai me surgiu a pergunta que não quer calar: o preso é obrigado a raspar ou a permitir que raspem sua cabeça?

Posso estar errado – mas estou convencido de que a resposta negativa se impõe.

Com efeito, o preso perde apenas sua liberdade de locomoção, mantendo preservados todos os direitos não atingidos pela prisão.

A propósito, o Código Penal é expresso quando positiva, em seu art. 38, que “o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral”.

Ora, o cabelo é parte corpórea da pessoa, que, ainda que presa, não perde o direito sobre seu próprio corpo, salvo no que diz respeito à sua liberdade, que, por decisão judicial, está cerceada. Assim, cabe ao preso decidir cortar o cabelo ou raspar sua cabeça.

Sendo assim, o Estado tem o dever de respeitar a integridade física do preso, incluindo nesta o seu cabelo.

A nosso pensar – mas posso estar errado – a submissão do preso ao procedimento de raspagem da cabeça sem que lhe seja dado o poder de decidir se concorda ou não com isso viola o princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). Isso porque esse tipo de procedimento implica em tratar o preso como mero objeto, recusando-lhe o status de titular do direito à sua integridade física.

Certa feita, eu fui acionado para defender um homem que havia sido preso em flagrante por crime afiançável. Quando fui até a Seccional de Polícia em que ele estava preso para pegar a procuração, cheguei bem na hora em que os agentes prisionais iriam raspar a cabeça dele.

Na hora, eu “fiz uma confusão” e não deixei rasparem a cabeça do cliente. Os agentes justificaram que, por medida de higiene e saúde, ele era obrigado a raspar a cabeça. Eu ponderei que ele não era obrigado, pois tinha o direito de preservar sua integridade física, o que inclui seu cabelo. Ademais, ressaltei que o crime era afiançável, e a chance dele ser solto no outro dia por decisão judicial era grande. Ele não deixou rasparem a cabeça e, de fato, acabou solto no dia seguinte mediante pagamento de fiança.

Se eu não tivesse chegado à tempo, ele teria saído com a cabeça raspada.

Aos colegas advogados sugiro que, sempre que possível, informem, mediante protocolo, ao responsável pela prisão o desejo do preso – se for o caso – de não raspar a cabeça. E, se acontecer a audiência de custódia, formulem pedido expresso ao juiz para que, se mantida ou decretada a prisão preventiva, seja assegurado ao preso o direito à sua integridade física, garantindo-lhe o poder de decidir sobre se raspa ou não a cabeça.

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